sábado, 18 de fevereiro de 2017

É preciso educar os educadores

Edgar Morin: é preciso educar os educadores


“A educação não pode ignorar a curiosidade das crianças” – Edgar Morin
Mudanças profundas ocorreram em escala mundial nas últimas décadas do século 20, entre elas o avanço da tecnologia de informação, a globalização econômica e o fim da polarização ideológica nas relações internacionais.
Diante desse cenário, o sociólogo francês Edgar Morin, hoje com 95 anos, defende que a maior urgência no campo das ideias não é rever doutrinas e métodos, mas elaborar uma nova concepção do próprio conhecimento. No lugar da especialização, da simplificação e da fragmentação de saberes, Morin propõe um dos conceitos que o tornaram um dos maiores intelectuais do nosso tempo: o da complexidade.
Em entrevista, o pensador critica o modelo ocidental de ensino que, segundo ele, separa os conhecimentos artificialmente através das disciplinas. Para Morin, as disciplinas fechadas ensinam o aluno a ser um indivíduo adaptado à sociedade, mas impedem a compreensão dos problemas do mundo e de si mesmo.
Entrevista concedida à Andrea Rangel/O Globo
Na sua opinião, como seria o modelo ideal de educação?
A figura do professor é determinante para a consolidação de um modelo “ideal” de educação. Através da Internet, os alunos podem ter acesso a todo o tipo de conhecimento sem a presença de um professor.
Então eu pergunto, o que faz necessária a presença de um professor? Ele deve ser o regente da orquestra, observar o fluxo desses conhecimentos e elucidar as dúvidas dos alunos. Por exemplo, quando um professor passa uma lição a um aluno, que vai buscar uma resposta na Internet, ele deve posteriormente corrigir os erros cometidos, criticar o conteúdo pesquisado.
É preciso desenvolver o senso crítico dos alunos. O papel do professor precisa passar por uma transformação, já que a criança não aprende apenas com os amigos, a família, a escola. Outro ponto importante: é necessário criar meios de transmissão do conhecimento a serviço da curiosidade dos alunos. O modelo de educação, sobretudo, não pode ignorar a curiosidade das crianças.
Quais são os maiores problemas do modelo de ensino atual?
O modelo de ensino que foi instituído nos países ocidentais é aquele que separa os conhecimentos artificialmente através das disciplinas. E não é o que vemos na natureza. No caso de animais e vegetais, vamos notar que todos os conhecimentos são interligados. E a escola não ensina o que é o conhecimento, ele é apenas transmitido pelos educadores, o que é um reducionismo.
O conhecimento complexo evita o erro, que é cometido, por exemplo, quando um aluno escolhe mal a sua carreira. Por isso eu digo que a educação precisa fornecer subsídios ao ser humano, que precisa lutar contra o erro e a ilusão.
O senhor pode explicar melhor esse conceito de conhecimento?
Vamos pensar em um conhecimento mais simples, a nossa percepção visual. Eu vejo as pessoas que estão comigo, essa visão é uma percepção da realidade, que é uma tradução de todos os estímulos que chegam à nossa retina. Por que essa visão é uma fotografia? As pessoas que estão longe são pequenas, e vice-versa. E essa visão é reconstruída de forma a reconhecermos essa alteração da realidade, já que todas as pessoas apresentam um tamanho similar.
Todo conhecimento é uma tradução, que é seguido de uma reconstrução, e ambos os processos oferecem o risco do erro. Existe outro ponto vital que não é abordado pelo ensino: a compreensão humana.
O grande problema da humanidade é que todos nós somos idênticos e diferentes, e precisamos lidar com essas duas ideias que não são compatíveis.
A crise no ensino surge por conta da ausência dessas matérias que são importantes ao viver. Ensinamos apenas o aluno a ser um indivíduo adaptado à sociedade, mas ele também precisa se adaptar aos fatos e a si mesmo.
O que é a transdisciplinaridade, que defende a unidade do conhecimento?
As disciplinas fechadas impedem a compreensão dos problemas do mundo. A transdisciplinaridade, na minha opinião, é o que possibilita, através das disciplinas, a transmissão de uma visão de mundo mais complexa.
O meu livro O homem e a morte é tipicamente transdisciplinar, pois busco entender as diferentes reações humanas diante da morte através dos conhecimentos da pré-história, da psicologia, da religião. Eu precisei fazer uma viagem por todas as doenças sociais e humanas, e recorri aos saberes de áreas do conhecimento, como psicanálise e biologia.
Como a associação entre a razão e a afetividade pode ser aplicada no sistema educacional?
É preciso estabelecer um jogo dialético entre razão e emoção. Descobriu-se que a razão pura não existe. Um matemático precisa ter paixão pela matemática. Não podemos abandonar a razão, o sentimento deve ser submetido a um controle racional.
O economista, muitas vezes, só trabalha através do cálculo, que é um complemento cego ao sentimento humano. Ao não levar em consideração as emoções dos seres humanos, um economista opera apenas cálculos cegos. Essa postura explica em boa parte a crise econômica que a Europa está vivendo atualmente.
A literatura e as artes deveriam ocupar mais espaço no currículo das escolas? Por quê?
Para se conhecer o ser humano, é preciso estudar áreas do conhecimento como as ciências sociais, a biologia, a psicologia. Mas a literatura e as artes também são um meio de conhecimento.
Os romances retratam o indivíduo na sociedade, seja por meio de Balzac ou Dostoiévski, e transmitem conhecimentos sobre sentimentos, paixões e contradições humanas. A poesia é também importante, nos ajuda a reconhecer e a viver a qualidade poética da vida. As grandes obras de arte, como a música de Beethoven, desenvolvem em nós um sentimento vital, que é a emoção estética, que nos possibilita reconhecer a beleza, a bondade e a harmonia. Literatura e artes não podem ser tratadas no currículo escolar como conhecimento secundário.
Qual a sua opinião sobre o sistema brasileiro de ensino?
O Brasil é um país extremamente aberto a minhas ideias pedagógicas. Mas, a revolução do seu sistema educacional vai passar pela reforma na formação dos seus educadores. É preciso educar os educadores. Os professores precisam sair de suas disciplinas para dialogar com outros campos de conhecimento. E essa evolução ainda não aconteceu. O professor possui uma missão social, e tanto a opinião pública como o cidadão precisam ter a consciência dessa missão.
Fonte: Fronteiras do Pensamento|O Globo

2,8 milhões de crianças e adolescentes estão fora da escola


A maior parte dessa população tem entre 4 e 5 anos e 15 a 17 anos. Se as metas do Plano Nacional da Educação vencidas no ano passado tivessem sido cumpridas, todas as pessoas dessa faixa etária estariam na escola.

Por:   Raissa Pascoal
A universalização da Educação Básica continua sendo um desafio no Brasil. Segundo os dados do Censo Escolar 2016, divulgados nesta quinta-feira (16/2) pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 2,8 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos estão fora da escola – o ensino é obrigatório para essa faixa etária. A maior parte dessa população tem entre 15 a 17 anos, idade considerada adequada para o Ensino Médio. São quase 1,6 milhão de adolescentes sem frequentar as aulas. No segundo lugar da lista dos que não têm acesso garantido à escola, estão os pequenos de 4 e 5 anos. São 821 mil crianças fora da pré-escola.
O atendimento de todos os estudantes da pré-escola e do Ensino Médio são metas do Plano Nacional da Educação (PNE), que está em vigor desde 2014. No entanto, o prazo para o cumprimento desses objetivos venceu no ano passado.

No caso do Ensino Fundamental, a história é diferente. A etapa é a que mais garante o acesso no Brasil. São pouco menos de 400 mil crianças de 6 a 14 anos que não estão matriculadas em turmas do 1º ao 9º ano, o que representa cerca de 2% da população nessa faixa etária. Segundo o PNE, o Fundamental tem até 2024 para universalizar a oferta. O prazo é o mesmo dado para a creche, que não é obrigatória, atender pelo menos 50% dos brasileiros de 0 a 3 anos. Hoje, a etapa só atinge 3,2 milhões de bebês (ou 25,6% dessa população). É nela que está a maior participação da iniciativa privada na Educação Básica.


Educação Integral

Os dados também mostram que não estamos perto de cumprir outro compromisso assumido no PNE: colocar ao menos 25% dos alunos da Educação Básica em escolas de tempo integral. O número de matrículas no Ensino Fundamental nessa modalidade caiu no último ano e, de 16,7% em 2015, passou para 9,1% em 2016, mesmo com a continuidade de programas como Mais Educação.
Por outro lado, no Ensino Médio, as inscrições subiram 8,6% e atingiram 6,4% dos alunos matriculados na etapa. Eram 5,9% em 2015. O tempo integral é uma das propostas da reforma do Ensino Médio, sancionada nesta quinta (15/2) pelo presidente Michel Temer. A reforma prevê, além da ampliação gradual da carga mínima anual, a organização da etapa em cinco itinerários formativos (clique aqui para saber mais).

Taxa de insucesso é maior na rede pública

O relatório do Censo traz outro dado preocupante. No 1º ano do Ensino Fundamental, a taxa de insucesso (soma de reprovação e abandono) é muito parecida nas redes pública e privada, no entanto, a diferença aumenta consideravelmente até o final do Ensino Médio.
O histórico de reprovação e abandono dos alunos, especialmente nos últimos anos da Educação regular, pode ser o fator determinante para o aumento do número de jovens matriculados na Educação de Jovens e Adultos nas turmas equivalentes aos anos finais do Ensino Fundamental e Médio.
O Censo Escolar é realizado todos os anos pelo Inep. A pesquisa levanta dados sobre matrículas, equipe e infraestrutura da Educação Básica, da rede pública e privada, de todo o Brasil. As informações são utilizadas para a elaboração e monitoramento de políticas públicas e definição e programas para a área. Para acessar o relatório detalhado, clique aqui.

Geração mal-educada chega às empresas

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